Aconselho esta musica ao ler este capitulo.
O suor escorria-lhe cara a baixo, ardia-lhe nos olhos, o fumo e o cheiro a enxofre enchia-lhe os pulmões, sentia os pulsos a arder, e nas costas escorria um líquido viscoso e quente até às pernas. Com esforço tombou a cabeça no seu ombro direito, olhou e viu as grilhetas metálicas incandescente em brasa que se apertavam em volta dos seus pulsos, esticando os braços cada um na direcção oposta. Perdeu as forças e deixou cair a cabeça em direcção ao chão, e viu que o líquido viscoso e quente que lhe corria pelas costas era sangue, formando uma poça mesmo por baixo dos seus pés suspensos.
– As minhas aaaasas...
O grito saiu gutural e abafado pelo sangue que se acumulava na garganta, engasgou-se e vomita-o em convulsão, sangue e mais sangue.
O seu corpo retesa-se em fúria, e quase desiste ao sentir a dor percorrer-lhe as costas, e as longas feridas abertas onde antes tinhas as asas espirram mais sangue.
O fedor da sua carne a arder nos pulsos, o suor que lhe tolda a visão e o vapor escaldante que emana das paredes da caverna quase o impedem de ver quando eles, seres a quem uma vez ele chamou de irmãos, entram com ela, nua com os braços presos atrás das costas e cortes profundos das garras deles a marcarem-lhe a carne. Atiraram-na para o chão, um fio de sangue escorre-lhe da boca. Quando o belo rosto dela, agora desfigurado se ergue para encontrar os seus olhos, uma lâmina penetra das costas para aparecer no meio do seu peito num vermelho brilhante, os lábios dela mexem-se mas não ouve som, mas ele percebe o que dizem… – Amo-te…
– Nãããããoooo…
O grito surge na sua garganta como um reflexo, como um rugido, dobra-se sobre si mesmo, sentado na cama arfando e massajando os pulsos como se os acabasse de libertar de umas algemas. Ainda conseguia sentir o ardor nas costas junto aos omoplatas, como se algo lhe tivesse sido arrancado a pele, deixando uma ferida aberta.
A tremer e a cambalear força-se para fora da cama em direcção à casa de banho, debruça-se pesadamente sobre o lavatório e abre urgentemente a torneira da água fria, enche uma mão com água, lava o rosto e olha-se ao espelho…
– Estás todo fudido meu…
E antes de conseguir terminar, o impulso de vomitar leva-o a jogar-se de joelhos em frente da sanita…
São 4:45 da manhã e está um calor impossível na rua. Ele caminha como que embriagado na escuridão. É todos os anos o mesmo sonho, desde que se lembra, sempre o mesmo sonho, sempre o teve, em Agosto, sempre no dia 23 de Agosto. Mas desta vez foi diferente, desta vez foi como se tivesse mesmo lá estado, tão real que ainda sentia os pulsos magoados e o ardor nas costas ao ponto de ter tido dificuldade em vestir uma t-shirt. Chegou à cabine telefónica, inseriu o cartão pré-pago e marcou o número, ouviu o som de chamada e um momento depois a voz rouca e ensonada de um homem:
– Foda-se, não sabem que horas são caralh…
– Sou eu…
– Meu, não tens…
Uma pausa, num tom grave ouve no auscultador:
– Feliz aniversário meu, onde estás?
– No sítio do costume.
– Dá-me 15 minutos, já aí vou ter.
Desliga o telefone, e cambaleia para um beco ainda mais escuro.
Nota: O pronome pessoal “ele” outros pronomes estão em letra maiúscula para identificar a personagem principal das outras personagens que também podem ser identificadas por pronomes.
"E temos ainda mais firme a palavra profética à qual bem fazeis em estar atentos, como a uma candeia que alumia em lugar escuro, até que o dia amanheça e Lúcifer surja em vossos corações" (II Pedro 1:19)
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